quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Guido e Martin

O céu e tudo o mais escurecia e se cobria de laranja brilhante pelo cair da tarde, o som mais alto era o dos besouros que se preparavam para a chegada da noite. O grande carvalho a seu lado parecia agora, mais do que nunca, um ser misterioso e imponente, que havia vivido em épocas tão outras que ainda trazia consigo um pedaço delas. Sentado no banco de pedra junto da cerca despedaçada, Martin ainda tentava se acostumar, ou pelo menos acreditar de verdade no que estava acontecendo. Ele nunca tinha imaginado realmente como seria se não tivessem mais a tia, Cornelius, ou os outros adultos por perto. Guido estava sentado mais à frente, no mato. Agora eram só os dois.

Guido partira um pedaço de pão e o colocara na frente dele. Martin imaginava no que ele estaria pensando. Estavam ambos na cozinha, Martin sentado à mesa e Guido pegando as coisas que encontrava para um jantar. Ele parecia tão responsável. Martin olhou para a janela. A lua já estava no céu, amarela e cheia, mas com a metade superior escondida por uma faixa de nuvem escura, como uma sobrancelha, parecia o olho de um dragão gigantesco e cinzento olhando para tudo quanto havia lá em baixo.

Estavam os dois calados. Como eles fariam agora? Como estariam todos, o gigantesco Cornelius, a amena tia Dora, os outros ciganos? Provavelmente pensavam ambos sobre a mesma coisa. Martin sentia um pouco de vergonha, mas a idéia de viver livre da proteção dos adultos lhe aprazia, apesar das dificuldades dessa vida, viver como o Assam das histórias que Emily contava. Na verdade eles sabiam que mais cedo ou mais tarde eles acabariam sumindo. Desde que aqueles homens, se é que podem se chamar assim, começaram a pedir “favores” cada vez maiores.

***
Cornelius carregava um baú de proporções pitorescas no ombro, carregava como Martin carregaria uma pedra para fazer pinturas do mato. Carregava e ria um riso afogado no branco que destacava seus dentes e seus olhos. Tia Dora, com seus compridos cabelos gris sobre o ombro, falava pausadamente e indicava coisas para todos, especialmente para Cornelius, que movia, carregava e ria no serviço inteiro, como se não houvesse peso que lhe estragasse o humor habitual. Se bem que, invergando daquela altura tamanho volume, se acentuava para um estranho sua aparencia quase assustadora de alguém muito grande. Emily mexia ocasionalmente nas peças de roupa que despontavam no meio da bagunça em movimento.

2 comentários:

  1. Please, don't stop!!
    God bless you, Carolina!

    ResponderExcluir
  2. 'I' don't stop nothing! Go to say this to Don Dias!! God bless all the heads!

    ResponderExcluir