quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Portratos

E se veria meu rosto por entre o relevo das tuas meias. Minha noite, meus olhos e meu esmalte vermelho. A rainha, a rainha quando está nua não aponta a tolice de ninguém, rainha ainda é rainha quando perdida entre os servos. Se veria meus olhos.

Eu a vi. Numa cama prateada de cobertores negros. A bela, a bela era branca como a luz da lua. Ela repousava, fascinei-me Luiz!, repousava em seu leito com os cabelos soltos, parecia feliz a minha dama. Mas então seu leito flutuou para longe, levou minha bela dama.

Me deixe repousar a cabeça aqui. Nem precisa parar, nem fazer qualquer coisa. Só quero apoiar a cabeça aqui um pouco, o que pesa nela, não se importe. Eu só quero... só quero fingir um instante que não sou tão só.

Sou aquele fantasma branco no teu quarto. Aquela memória vaga esperando pra ser lembrada. O feixe de luz que escapa da brecha, mas morre embaixo da cama. Sabe de mim o que imagina. Sou teu. Teu fantasma.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Pois é.

É como a história do Homem da Grama. Não, não a do Homem da Grama, a do cara que via o Homem da Grama. Ele vivia dizendo isso, e falava do perigo que esse Homem era, que ele era louco e coisa e tal. Chamavam o cara de louco. Que era alucinação dele, esse Homem da Grama não existia. Acontece que o tal Homem da Grama existia mesmo, só que quando ele começou a atacar e sequestrar as pessoas, elas estavam ocupadas demais se apavorando pra lembrar que o cara lá do começo tava certo, que elas poderiam ter feito alguma coisa.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Nublado

Clara era filha da orgia. Poucos sabiam disso. Foi criada por uma senhora austera numa casa que em muito se assemelhava a um convento. Essa senhora, que Clara queria como a um feitor, pouco vestia-se que não de preto, pela pura habilidade de combinar-se com sua personalidade; e a casa grande e calma, sem outras vozes menos ocasionais, não oferecia mais encantos que a incentivassem. Nesse silêncio, Clara cresceu sem espaço para ser algo que ela não detestaria mais tarde.

Clara tinha algo com espelhos. Sempre parecia ver uma pessoa especialmente estranha neles.

A casa em estilo antigo, com sua floresta e suas portas grandes, ainda não era habitada por outras garotas. Clara ia desenvolvendo curiosidades opacas em sua personalidade, como sentir coisas que não estavam perto, e não sentir coisas que estavam. E ter gostos totalmente alheios a tudo, quando os tinha.

Como era de se esperar, talvez, a aparência de Clara era Apatia. Seus silêncios eram bem medidos e suas falas comedidas, mas ambos verdadeiros. E curiosidades menos opacas apareciam com o tempo.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

De quando as pedras falam


Um calafrio gélido nas pernas e um calor no rosto, mais frio que chuvas de inverno. Você sabe do vazio. Sempre soube. E continua igual. Mas em alguns momentos o azul se torna negro e o negro se torna mais negro. E sentir patético nenhum vai mudar que a certeza do frio apavora uma alma forte. A certeza do nada. Agora, antes, e sempre.