terça-feira, 3 de abril de 2012

Parecia que o dia só estava frio daquele jeito para combinar com a imagem do Natal. Ele acordara embaixo das cobertas pensando que ainda era de madrugada, o céu estava cinzento e o ar do quarto, escuro. Mas o sono, mais precisamente a falta dele, denunciava o avançado da hora, 11:30. Bufou. Enrolou-se um pouco mais antes de descer. Mesmo sem ter o que fazer ainda, arrumou-se e desceu, sentia uma força de vontade indesperdiçável. Andou até chegar no parque, as ruas, incrivelmente, nada cheias. Uma leve impaciência começando a se formar nas suas mãos que tentavam em vão se ocupar num livro. Levantou pronto pra voltar a caminhar quando seu telefone tocou. Tateou e o colocou no ouvido antes de descobrir que era uma mensagem.
"Você sabe cozinhar?"
Era Natalia. Ele sorriu. Respondeu.
"Não."
Em poucos instantes ela mandou de volta:
"Perfeito! Me encontra na cozinha."
Ele franziu o cenho. Sim, estava entediado, e sim, adorava a companhia de Natalia, mas, estranhamente ou não, não sentia vontade alguma de embarcar no programa. Mas deu de ombros e voltou a andar pelas ruas frias e claras com as mãos nos bolsos. No caminho entrou num mercado milagrosamente aberto e deu uma olhada, despreocupadamente. Depois percebeu que não ia comprar nada e saiu, quase embaraçado.
Encontrou uma Natalia muito aturdida em meio a panelas, formas, livros e milhões de outras coisas que não teve tempo de distinguir antes dela lhe lançar o mais exasperado:
   - Pelo amor de deus, me salva!
   - Como, pelo amor de deus, eu poderia fazer isso?
   - Me ajudando a carregar o jantar, pelo amor de deus. - disse com um sorriso gigantesco.
Entraram no mesmo mercado em que ele havia passado antes, o único aberto pelas bandas. Depois de anos de discursão e ponderações sobre quantidade, preço, marca e tempo de cozimento, compraram uma quantidade razoável de lazanhas, ervilhas, queijo e outras coisas para as quais ele não via um uso compreensível. Natalia falava sandices atrás de sandices, o fazendo rir, quase tagarelando tanto quanto ela. No caminho da volta toda foram conversando coisas banais e uma ânsia surda foi se instalando nele, a qual ele só percebeu perto do fim da tarde, depois de arrastar todos os móveis da sala de Natalia em meio a copos de refri e músicas ruins.
   - Como assim? Você não vai ficar pro jantar?
   - Não...
   - Mas depois de todo nosso trabalho! Ah não Ti, fica vai, eu não chamei a Marina, nem o Theo, juro!
Ele respirou fundo antes de encerrar:

   - Não vou ficar Natalia.
Ela fez uma careta antes de dizer um "tá bem".

Agora ele não sabia o que fazer. Passeou pelas ruas cheias de luzes, olhando os enfeites, até perceber alguma coisa errada. O que era...?
   - Merda.
Uma bola azul de luzes balançava ferozmente na frente da casa, soltando um rugido ao empurrar o ar pesado ao redor.
   - Tudo bem aí?
   - Claro. - respondeu um chapéu. Ao menos foi isso que ele distinguiu na janela superior.

   - Ahm, certeza?
   - Claro.
Antes daquele negócio despencar como a Torre de Pisa nunca tinha feito.
   - Ih... - disse o chapéu antes de sumir.
Instantes depois, nos quais ele ficou plantado sem saber o que fazer, apareceu pela porta uma garota no mínimo divertida debaixo do chapéu. Começou a arrastar a coisa azul para a lateral da casa. Ele tentou ajudar, ela tentou recusar, mas o negócio enganchava na grama e logo os dois estavam carregando a bola pra junto das plantas do canto. Leo, como ela se apresentou, agradeceu depois de arfar. Sem saber bem o que dizer, ele falou:
   - Bem, Leo, bolas azuis costumam cair muito da sua janela?
   - Só quando tem rapazes gentis para ajudar a me livrar das provas. - foi a resposta bem humorada dela.
Os dois riram. O telefone dentro da casa tocou e Leo correu pra dentro sem dizer nada. Parecia que ela tinha se esquecido dele ali fora, mas quando ele se preparava pra sair ela apareceu, fechou a porta e disse:
   - Topa ser um rapaz gentil outra vez?

***

   - Não você não vai precisar carregar nada dessa vez.
Ele riu um tudo bem enquanto andavam pelas ruas iluminadas e frias.


   - Então, de que estamos fugindo?
   - Não sei do que você está falando - ela respondeu sorrindo.
Eles conversaram muito e muito pouco ao mesmo tempo enquanto andavam pelas ruas, passavam por praças e lojas entupidas todas de luz e pessoas agasalhadas.
   - Ah! já sei quem você é! - disse ela certo momento. Com a expressão esperada de não entendimento dele, ela prosseguiu - Você é Boy Walter. O mocinho que nunca recebe o mérito nem a garota. E não tira fotografias.
E com isso ela riu solto, como se fosse a constatação menos passível de questionamento no mundo.
   - Deve estar errado. Eu não sou um mocinho.
   - Já sei. - ela disse e sacou algo da bolsa de couro que carregava do outro lado. Estourou um flash no olho esquerdo dele. Sorriram. Ele concordou.
   - Resolvido. Ou quase, não sei quem você é.

***

Começava a se apossar dele um sentido estranho. Um querer sem mais, a perder de vista. Enquanto debatia em sua mente o que exatamente queria, decidiu que queria um café. Nessa hora, Leo decidiu que iria por outro lado e ele acabou decidindo que queria mais acompanhá-la. Rodaram muito mais do que ele achava que jamais faria numa noite fria de feriado.
   - Alguém já deve ter te dito que você é uma garota estranha.
   - O que? Sem pergunta? - sempre bem humorada.
Ele estava ficando tonto com aquele sentido estranho que se infiltrava como o frio, questão de hábito, quis constatar. Talvez fome, ele estava com fome. Perto do fim da noite, entendeu onde esse querer estava indo. O chapéu, tudo o chapéu. Sorriu com esse pensamento descoordenado.
Ele olhou o relógio na tela do celular, era quase meia noite.
   - Vou ficar aqui perto.
   - O que acontece com o templo da bola azul de onde saímos?
   - Continua lá.
Tão tarde e nem sinal das ruas que deixaram diminuírem as luzes ou as pessoas e seus sons felizes e quentes de festividade. Entravam agora numa ruazinha fria e calma onde, depois de uma caminhada breve, ela parou na frente de uma escada e disse que ficava ali. Ele olhou bem pro rosto de Leo e lhe tirou o chapéu. Ela olhou bem pros olhos bicolor dele, sorriu, pegou o chapéu e acenou, mas não se afastaram. Um estranho qualquer que passasse aquele momento pela rua não entenderia absolutamente nada do que se passava, se ligasse para isso.

Ele caminhava devagar com as mãos nos bolsos do casaco. Era meia noite. Também pensava devagar, sem pressa. Ela havia dito seu nome e sorria.
   - Feliz Natal.



2 comentários:

  1. Bem, eu poderia falar varia coisas, como eu não estava com coragem de lr quando vi, ou que quando comecei eu esperava que me surpreendesse, ou sei la, mas em fim, tem coisas que vc lê e não te surpreende, e não te cansa ou te anima, mas que vc pensa, valeu a pena, é foda e eu não queria passar mais um dia sem tr lido, pois é isso, estou muito feliz por tr lido, valeu muito a pena, ficou lindo e foda... xD

    ResponderExcluir